Por José
Mendes Pereira
Cadê o João
Malamanha que não vem acompanhando o enterro? Esta era uma das perguntas feita
no meio daquela gente que acompanhava um fúnebre.
Ninguém em Mossoró participava
de enterro mais do que ele. Se ouvisse falar que alguém tinha
falecido fechava a sua oficina mecânica,
e com o anão Leandro, seu ajudante de mecânica, os dois se abalavam para presenciar a tristeza dos que ficaram, o choro das pessoas, as lastimações da
viúva, dos pais, dos irmãos, a missa de corpo presente, a conversaria do povo
amigo e principalmente, tomar um cafezinho ou uma pinga em um bar mais próximo
do velório.
Apesar da sua honrosa
fama de valentão, perverso, grosseiro ao estremo, mas o João Malamanha tinha um coração brando e amável para
aquele que vestia o seu paletó de
madeira e se mandava à procura da casa do Senhor Deus. E até diziam em boca
miúda que quando ele se encostava ao caixão ficava falando com o morto, aconselhando-o, que nunca mais
voltasse ao chão terrestre. Ficasse por lá mesmo para não atazanar quem por
aqui ficou.
E parece que
era mesmo verdade. Alguns mortos que ele não tinha os acompanhado até o
cemitério, às vezes, apareciam as pessoas. E se isso acontecesse, a cidade toda
logo dizia: “Só está aparecendo porque o João Malamanha não foi ao seu
enterro”.
Devido o seu agigantado
tamanho o homenzarrão era visto de longe em caminhada fúnebre. Se o caixão fosse
colocado em túmulo ele participava ajudando o coveiro, levando o caixão para
dentro da urna. E se o morto fosse enterrado em cova rasa, de costume, a
primeira pá de barro sobre o infeliz seria
colocada pelas suas deformadas mãos.
Aquela
tradição de ser ele quem colocava a primeira pá de areia sobre o caixão
ninguém nunca havia protestado. E quem era doido, besta ou tolo para criar uma
minúscula confusão com um homem deformado e fora dos padrões humanos? Deus que
tivesse dó de quem se atrevesse desafiá-lo. O menor castigo que o desafiador
iria sofrer, seria um malvado cocorote de afundar a carapuça da cabeça
cabeluda. E adeus, provocador!
Costume é
costume. Até o enterro do ex-governador do Rio Grande do Norte Jerônimo Dix-sept Rosado Maia, falecido no Estado de Sergipe em Aracaju, em 12 de julho de 1951, a causa, desastre aviatório, ele também presenciou. O do famoso religioso mossoroense Luiz Ferreira da Cunha Mota o “Padre Mota” em 27 de agosto de 1966, que foi sepultado
na Catedral de Santa Luzia de Mossoró, o
João Malamanha lá estava, e deu uma ajudinha ao coveiro no momento de colocar o
caixão na cova rasa. Um enterro que aconteceu em 1962, e que de forma
alguma ele podia faltar, porque eram amigos de serenatas, foi o do Cocota, irmão
dos componentes do Trio Mossoró. João Malamanha chorava como criança e deixou
todos os presentes de boca aberta, só porque o deformado homem era macho todo, e
por último, estava chorando, quando é de conhecimento de todos que homem não
chora. No velório da professora e juíza de futebol Celina Guimarães Viana a primeira mulher mossoroense a votar, ele não faltou, também estava presente.
Um dia o João
Malamanha faltou no meio daquela gente que acompanhava um enterro. O homenzarrão
já era conhecido por todos como assíduo acompanhante de velório, e aqueles que seguiam o
cortejo só por uma obrigação humana, não sabiam o motivo da sua falta naquele
velório, e perguntavam-se uns aos outros:
- Cadê o grandalhão
João Malamanha que não está participando deste fúnebre? Será que ele está
doente ou viajou para longe e não está sabendo?
- Não sei...!
– Respondia alguém.
E outro:
- O que foi
que aconteceu com ele que não veio ao velório?
Um velhinho
que tinha muito conhecimento com o João Malamanha disse aos ouvintes que ele
estava presente. Ninguém o via, mas ele estava vendo todos. E impaciente, duvidou
um abelhudo e fofoqueiro:
- E como
ninguém o vê e em que lugar ele se
encontra, porque desde que eu cheguei ainda não o vi?
- O João
Malamanha não está aqui no meio de nós, porque quem vai dentro do caixão é ele. –
Respondeu o velhinho.
- Mas o João
Malamanha morreu? Qual a causa da morte? – Perguntou um curioso em tom de assombro!
- Foi
assassinado pelo seu ajudante de mecânica. – Disse o velhinho.
- Aquele
pequenino Leandro o matou? Aquele que o acompanhava nos enterros?
- Sim senhor! A
gente ver cara e não ver coração... – fez o velhinho ex-amigo do Malamanha.
Adeus, João
Malamanha!
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