Por José Mendes Pereira - (Crônica 98)
Fazia uma porção de meses que seu Galdino Borba(gato) Mend(onça) não andava na casa do seu Leodoro, porque ele sempre se achava mais do que o seu compadre, por isso, só ia lá a negócios. Mas quando seu Galdino visitava seu Leodoro duas coisas eram por puro interesse. A primeira era ver a dona Gertrudes esposa do seu Leodoro, que na sua mente, ela tinha uma paixão louca por ele. A outra, quando estava precisando de algo para o seu dia a dia, ia até lá para tomar emprestado ao compadre, só assim evitava correr à cidade de Mossoró para comprar. Mas essas aparições na fazenda do seu Leodoro eram mais para contar histórias sobre onça.
Nesse dia, eram seis horas da manhã quando seu Galdino foi chegando e viu que seu Leodoro Gusmão consertava uma sela que estava descosturada no encosto. E aproximando-se sutilmente do local onde seu Leodoro sentara, disse-lhe:
- Bom dia, compadre Leodoro?
- Mais que medo eu tive, compadre Galdino! - Exclamou ele virando-se em direção a sua direção, após ter o susto com a voz do compadre. Quando o senhor falou compadre Galdino, eu estava displicente no reparo da sela, nem percebi que a sua pessoa vinha chegando..., por isso, tive medo..., e o que houve que me apareceu esta hora aqui, na minha casinhola?
- Eu estou precisando de uma corda resistente, porque eu tenho que ir ao campo pegar aquele meu touro. Faz dias que ele não vem ao curral. Já arregimentei dois vaqueiros para esta finalidade. Tem que ser uma corda forte, compadre, porque o senhor sabe, touro bravo, só cordas boas o seguram.
- É verdade, compadre, e tenho a corda que o senhor precisa! – Disse seu Leodoro caminhando em direção ao curral para apanhar a corda.
Pouco tempo, seu Leodoro Gusmão chegou com a corda em uma das mãos. Mas o interesse de seu Galdino Borba(gato) não era nada de corda, e sim, aproveitar o assunto da corda e iniciar uma fantástica história de onça. E assim fez quando seu Leodoro o entregou a imensa peça em suas mãos.
Sentado em um tamborete no terreiro da casa, e examinando-a, disse:
- Bela corda, compadre Leodoro! Bela corda! É muito resistente. Segura qualquer animal. Ao vê-la, lembrei de quando eu ainda era jovem, muito jovem, eu tinha mais ou menos 22 anos de idade. Eu era um brotinho ainda. - Dizia ele examinando-a. O meu pai Galdino me pediu que eu fosse tirar umas cascas de mororó para fazer buchas e serem usadas em sua espingarda. Saí cedinho de casa, porque eu tinha outros afazeres. Peguei meu facão rabo de galo, uma corda..., e tudo mais.
- Meu compadre, mas para que o senhor precisava de corda, já que ia somente tirar as cascas do mororó para fazer buchas para a espingarda...?
- É que sempre isto me acompanhou, atalhou ele. Se eu entrar numa mata, facão, corda e outras ferramentas vão comigo..., pois bem, fui sempre beirando uma cerca que se estendia até a propriedade de um homem rico, pois nem seu nome eu sabia. Já próximo a um riacho, que apenas conservava água, mas apartada, este riacho eu ainda não o conhecia, ouvi um rugido como se fosse de onça novinha. E cautelosamente, com cuidado, fui chegando, chegando, e vi que um animal se mexia ali.
- E que animal era, compadre Galdino? – Perguntou seu Leodoro já com pressa para saber que bicho ali estava.
- Calma, compadre, eu chego lá..., pois sim, como o riacho estava com as águas apartadas, e o terreno era como se fosse atoleiro, percebi que aquele animal estava atolado. Sabe que bicho era, compadre Leodoro?
- E como eu quero saber, compadre!
- Era uma onça parda que tentava passar pela água de um lado para outro. Temendo o tamanho da bicha, que ela poderia querer fazer gracinha comigo, isto é, querer me matar, mesmo assim, fui ver se eu conseguia retirá-la dali. A onça não usou nenhuma reação quando eu me aproximei dela. E fui tentando aos poucos, puxando de um lado para o outro, isto dentro da água. Fui indo, fui indo, puxando-a para fora do riacho. Tinha momento que quem ficava atolado no barro era eu, e em outro momento, era ela, e com essa peleja toda, finalmente, pelo sangue de Jesus, consegui salvar a danada da onça, deixando-a fora do atoleiro e da água.
- Graças a Deus, compadre Galdino, o senhor é um homem de muita sorte.
- Mas não ficou por aí não! E assim que ela se sentiu livre, meu compadre Leodoro, em vez de ir embora, ela partiu para cima de mim, como se estivesse com raiva porque eu a ajudei sair dali.
- Meu Deus, em vez dela agradecer o que o senhor fez por ela, quis foi matar o compadre! – Exclamou seu Leodoro.
- Mas é assim mesmo! Ela é um animal, e pior é gente que deixa o seu semelhante atolado, e se for ajudá-lo, ao término da ajuda, se não o roubar, quer que o pague.
- É verdade, meu compadre! É verdade! O bicho homem é mais animal do que o próprio animal irracional.
- Solução naquele momento, continuava seu Galdino, para salvar a minha vida, não existia. Só se eu tentasse vencê-la através da minha força e dos meus próprios braços. E assim fiz. Ela partia para me prender com as suas mandíbulas pontiagudas, mas eu me desviava.
- Eu acredito que o senhor lutou muito...
- E bote luta nisso..., aí resolvi usar as minhas ferramentas. Primeiro, puxei o facão, mas com toda sua força, só uma patada que ela deu no facão, fiquei sem ele. E por último, rápido, retirei a corda que estava no meu peito em forma de cartucheira de cangaceiros, empunhei-a em uma das mãos, e cada vez que ela vinha para cima de mim, eu metia-lhe a corda sobre o seu lombo que fazia dó quando ela batia.
- Mas mesmo apanhando do senhor ela não queria desistir, compadre Galdino?
- Onça é onça, compadre Leodoro Gusmão. Ela morre apanhando, mas jamais desistirá fácil.
- E o final, compadre Galdino, quem foi que ganhou esta confusão toda, foi o senhor, ou a camarada onça parda?
- Claro compadre Leodoro, quem venceu foi eu! Ela sentindo que não me venceria fácil atirou-se nas matas numa velocidade tão grande, que nem sei que rumo tomou.
- Compadre Galdino, eu admiro muito esta sua coragem de enfrentar onças bravas por aí nestes tabuleiros nas caatingas.
- Compadre Leodoro, o vencedor é quem sempre conta a história! E eu brinco?
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