terça-feira, 1 de maio de 2018

NOUTROS TEMPOS, ALÉM DE JOVEM E MATUTO, EU NÃO TINHA EXPERIÊNCIA


Por José Mendes Pereira

Noutros tempos, muitos jovens erraram, não pelo fato de quererem errar, mas por falta de experiências. Os jovens eram verdadeiros amigos dos pais, e os obedeciam ao pé da letra. Se o pai dissesse tem que ser assim, assim, assado, nada fazia o filho tomar outro rumo diferente, e quando acontecia o contrário, era caso isolado, talvez de 100, apenas um.

Aos 16 anos de idade errei, mas não foi coisa tão grávida assim, e que não chegou aos ouvidos dos fofoqueiros, porque somente meu irmão e eu vimos o meu erro apontado por um sargento da polícia, e até um pouco engraçado. Não fui castigado por quem me repreendeu, pois entendera a minha inocência, talvez, pela minha idade “16 anos”. Mas meu grande amigo leitor, vá lendo e não imagina que eu fiz algo decepcionante. Não.

Chegara da Paraíba meu irmão “Chico Mendes” com uma mão na frente e a outra atrás, que fazia alguns anos da sua saída do domínio do meu pai, e por lá, residia. Desejou conhecer outros lugares, e assim fez. Mandou-se de Mossoró sem destino, fixando-se no Estado da Paraíba, e por lá, casou-se.  Depois, retornou, porque por onde andou, só trabalhou para os outros, e nada fez para si.  Desempregado e com três filhos pequenos, resolveu receber novamente proteção do meu pai, da minha mãe, finalmente, de pais e de irmãos (exceto eu, porque eu já vivia aos cuidados da Casa de Menores Mário Negócio.

E de imediato saiu à procura de emprego pela cidade de Mossoró. Tomou conhecimento que a Emserv - Empresa de Serviços e Vigilância Ltda. com uma filial em Mossoró, à Rua Bezerra Mendes, centro, necessitava de completar o seu quadro funcional com mais um vigilante. Confiante que poderia ser um dos seus empregados, porque ele era musculoso, abalou-se com todos os seus documentos. Ao chegar ao portão da empresa foi informado que para ser funcionário dela, era necessário, ter pelo menos, o diploma de conclusão do 5º ano, isto na época. Como ele não dispunha de tal diploma perguntou-me se seria fácil adquiri-lo através de pessoas conhecidas. Sabendo que não seria tão fácil um diploma de 5º ano com ninguém, me dispus a fazê-lo.

Antigamente, as livrarias vendiam estes diplomas tipograficamente, mas só quem os usavam legalmente eram os diretores de escolas, porque tinham toda autonomia para este fim, isto é, preenchê-los para os seus alunos quando terminavam o 5º ano primário.

Fui até a “Livraria e Tipografia Nordeste”, no centro da cidade, do grande empresário Francisco Vasconcelos (Fransquim Vasconcelos como era chamado), comprei um, e ao chegar na instituição que eu morava, preenchie corretamente com todos os dados do meu irmão “Chico Mendes”, criando o nome da instituição “Escola Municipal Rodolfo Fernandes”, e assinei como diretor . No dia seguinte, ele me apareceu para levar o seu belo diploma, muito embora nada valia. Com ele em mãos, se mandou para a empresa, que com certeza, a vaga para um futuro vigilante ainda estava aberta. Uma hora depois, “Chico Mendes” estava diante do diretor da Emserv, um sargento da polícia (evito citar o seu nome), entregando a documentação acompanhada do valioso diploma de 5º ano primário. Que beleza!

Revisando todos os documentos do futuro vigilante o sargento viu o diploma da “Escola Municipal Rodolfo Fernandes”, e quis saber o local da mesma. “Chico Mendes” que estudara apenas quando criança, porque nascera na “Barrinha” (nosso berço amado, menos de oito quilômetros da cidade de Mossoró e tinha apenas uma escola isolada), sem noção, disse ao sargento que não se lembrava onde ela ficava, porque já fazia muitos anos que tinha partido daqui.

Com essa informação do meu irmão que não sabia mais o local da escola, o sargento,  cheio de psicologia, viu logo que o diploma era falsificado, e sem querer espantar a mosca, perguntou quem era o assinante do diploma. “Chico Mendes” não escondeu nada, e não tinha como esconder, disse-lhe que era o seu irmão, no caso, eu. Ciente da falsificação do diploma de 5º ano, o sargento disse-lhe que não só tinha um emprego para ele, mas também, um para mim, e exigiu, que no dia seguinte ele me levasse para ocupar uma vaga lá em outro setor.

Ao receber esta informação, mais ou menos 4 horas da tarde, fiquei sem saber mais quem eu era. Passei quase a noite toda em claro. Ali, deitado em uma cama de acampamento feita com molas e lona. Tinha  momentos que eu me impulsionava sobre a cama, fazendo com que as molas me levassem às alturas (assim como um pula pula para crianças), somente para comemorar aquele convite de emprego. Noutros, eu imaginava já assumindo a função de qualquer coisa, sentado ao lado de um birô, ordenando alguém, que faça isso, espana os birôs, dê uma geral no piso..., afinal, era o meu primeiro emprego. Talvez, um auxiliar do sargento da polícia Militar de Mossoró, um encarregado de setor pessoal, ou extraindo notas ficais, prestando contas aos clientes da empresa pelos seus serviços prestados, ou ainda, quem sabe lá, um substituto de gerente na ausência do sargento. Nossa! Que felicidade!

Neste dia, mesmo tendo passado quase a noite toda em claro, acordei cedo. Fui ao banho, depois ao vestuário, vesti-me, calcei os pisantes meios surrados e fiquei aguardando a chegada do “Chico Mendes”, que com ele, eu iria caminhar até ao centro da cidade, lá na Bezerra Mendes, para o emprego que na noite anterior, quase não me deixou dormir.

Mais ou menos 8:00 horas da manhã, “Chico Mendes” e eu estávamos diante do sargento da polícia Militar. Encaminhado por um vigilante à sala do sargento, fomos recebidos por ele com um riso..., aparentemente, mas ele estava apenas demonstrando-nos falsa simpatia. Em seguida, ordenou que nós sentássemos, mas agora no meio de um sorriso, levando todo o seu corpo em movimento e afogado neste sorriso e com o diploma em mãos. Em seguida, perguntou-me:

- Você é o José Mendes Pereira?

- Sou, sim senhor! – Respondi-lhe ofegante.

- Quantos anos tem?

- 16 anos. 

E estirando a mão direita em minha direção, aguardando a minha mão para um aperto das nossas mãos para me parabenizar, e ao apertar a minha mão, disse:

- Parabéns! É a primeira vez que tenho conhecimento que um adolescente com 16 anos já é diretor de uma escola..., verdade?

- Não senhor, sargento..., eu não sou diretor de escola.

- E porque você assinou um diploma que nele afirma que o diretor da escola citada é você? 

Calei-me. Não tinha mais como me justificar diante de meu erro e diante de uma autoridade militar.

- Olha, eu vou empregar o seu irmão porque me parece ser um homem de responsabilidade. Mas tanto você, como ele, merecem serem presos. Ele queria um diploma do primário, e como você não tinha como adquiri-lo, falsificou-o. Mesmo sabendo que era falsificado, o seu irmão aceitou o diploma.

Só sei que deu tudo certo, menos o que eu pensava que a convocação do sargento era um emprego para mim. Meu irmão foi empregado lá durante muitos anos, e até era amigo do sargento. Saiu da empresa porque quis ser marceneiro, que sempre foi um dos seus desejos.

 http://josemendeshistoriador.blogspot.com

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